Sentimento e razão
São dois irmãos siameses
Cérebros diferentes
Mas os mesmos desejos
E o mesmo coração
Ambos andam na mesma direção
Personalidades opostas
Mas se um tenta passar por cima do outro
Sucumbem ao fracasso
Quando logram comunicação
As decisões são sábias
Equilibradas
Contornam seus obstáculos
Reparam quaisquer danos
Ninguém pode gritar mais alto
Pois não podem trilhar diferentes caminhos
Sabem que ouvir é mais importante que falar
Se o sentimento não dá ouvidos à razão
Os danos podem ser irreparáveis
Decisões puramente racionalizadas
Perdem a cor e o encantamento
E a vida fica tão árida vazia de sentimento
Muitas vezes, o amor é mais importante que a razão
Mas, amar é também pensar e pensar é também amar
O Bem e o Mal moram na mesma casa
E o prazer é o amigo íntimo da dor
Vida e Morte casaram-se
E somos seus eternos convidados
Saber pensar e sentir é aceitar o convite da Vida
E vivê-la, ao mesmo tempo, com sabedoria e intensidade
O mundo tem perdido a razão para a imbecilização da consciência
São inúmeros os exemplos pelos veículos midiáticos ou pela Literatura
Vinganças machadianas
Precipitações como no caso drummondiano da Morte do leiteiro
A impassibilidade humana em Uma vela para Dario de Dalton
Trevisan
A violência intestinal como nos contos de Ruben Fonseca
Como nos contos de terror de Horacio Quiroga
Fernando Sabino e sua crônica dramática
O homem que havia morrido de fome em pleno centro de uma cidade
Por ali passavam milhares de pessoas
Certa vez, li no jornal uma notícia cuja manchete dizia:
“mãe assassinada a golpes de faca
na frente dos seus três filhos pequenos”
Três crianças pequenas, na formação embrionária da consciência
Seres que sentiam, que teciam seus primeiríssimos pensamentos
Seres que tinham na mãe seu referencial de acolhimento, de amor
A sua “heroína”
Por mais cheia de defeitos que ela poderia ser
Não é novidade o esvaziamento da alma do outro para que se torne coisa
E, como coisa seja tratado
Ora para que seja escravizado, ora pelo embalo de outro sentimento detestável
Aquele que desumaniza, já se desumanizou
Aquele que coisifica, já se coisificou
Aquele que não vê a alma alheia, já perdeu a sua própria
Congelado num torpor que lhe esteriliza a razão
Em Vidas Secas, de Graciliano Ramos:
A secura dos seres os torna bichos ou coisas
Mas os bichos podem ter sentimentos mais afáveis que de seres (ditos
humanos)
Assim, perde-se a razão e a capacidade de administrar os próprios
sentimentos
Alguns de nós conseguimos
enxergar além do que vemos
Desprendemo-nos da matéria
orgânica presa pelas correntes do tempo físico
Superamos a frialdade das substâncias
mórbidas
Animamos nossa própria
desesperança
Acendemos uma luz pálida onde
impera a tépida escuridão
Mesmo onde já se tem instaurado
o lodo caótico
Encabeçado pela desordem,
incerteza e dor
Sentimentos desordenados trazem a
imbecilização da razão
Sem alguma companhia de
sentimentos, a racionalidade pura nos sufoca
Deve um acolher o outro, é uma
vida de cumplicidade
O Ser, pois, supera seu estado
de coisa e restabelece seu estado de integridade
Onde houvesse amor com sabedoria, tudo floresceria
Ah, este, o Amor, de quem Platão já tão comentara em seu clássico O
Banquete!
Este, que o mestre dos mestres tanto primou por nos exemplificar
Este que “tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta”
O Amor não tem sexo ou religião
Muitas vezes se sacrifica ao invés de sacrificar
Se, acaso falte conhecimento ou hesite a racionalidade
Este, o Amor, fortalece o estado do Ser
Faz-nos maiores e mais fortes que as tempestades
Enaltece o ser-pensante, porque recupera seu discernimento
E, por fim, traz de volta a luz, a vida...
E supera toda a angústia que quase nos coisificou!
By Danillo Macedo
Goiânia/Edéia, 13 de janeiro de 2024