Le
silence éternel de ces espaces infinis m'effraie
– Carlos Drummond de Andrade –
Nada começa, se tudo se acaba...
Morre um pouco de nós
Perdoe-me a autodepreciação
O que me sobrou de resiliência
Por que sempre erramos?
Há muitas perguntas
Nenhuma resposta...
Sabe mais quem sabe menos
Mais fundo e mais lento
Caminho para a água e para o fogo
Somos quentes e frios
Por isso a Eternidade nos vomita...
Não sei se minha mente coincide com a
alma
Para os antigos, a alma é pura e o sábio
inclina para ela seu espírito
O coração inane parece coisa da carne
Não sei que fome sente o espírito
Espírito como intelecto, instintos
reorientados
Não sei que comida há para tanta fome
De tanta coisa impura, talvez fome de
serenidade
Quando penso demais até esqueço que
tenho coração
Fica tudo meio fraco e meio forte
Minha substância do Devir cumulando
neste espectro transato
Queria, por um só instante, ser eu
mesmo...
Quando tivesse ou não vontade de sê-lo
Sei que pareço contraditório
Triste ver a máscara decompor meu rosto
E ter vivido menos para mim mesmo
Adornando a feiura das coisas
À sensação de não ter vivido nada
A felicidade é uma entrega
Não paramos de buscá-la
Torna-se mais dramático quando não
chegamos ao lugar esperado
Arrastamo-nos para nos sentirmos grandes
E nos debatemos na própria pequenez
Patéticos?
Talvez sejamos quando nos batemos uns
com os outros
Tentando diminuir os outros
Em padrões invisíveis de medição
Não enxergamos que somos menores que um
grão de areia
Diante da variedade mágica do Universo
E mais patética a cena:
O nosso orgulho escondendo lágrimas
Até o próximo espelho verter pó e
restolho
Quis muito fazer pelos outros
Porém, hipócrita, fazia por mim mesmo?
Andamos em círculos?
Viemos do nada, iremos para o nada?
Mesmo assim, não aprendemos nada?
Reduzimos nossa vida a menos ainda
matando uns aos outros?
Quando podíamos, ao menos, ter sido
partícipes de um filme feliz
Cujo enredo não fosse o terror de tentar
aniquilar a felicidade dos outros
Vendendo manuais de dez passos que não
podem, por ninguém, ser dados
Até que atravessássemos o muro que nos
separa
Entre grades solitárias, câmeras
viciadas, concertinas aflitas e cadeados que inibem a movimentação de corpos,
mas sufocam mais ainda sentimentos e desejos escarmentados
Até ver cair o véu que cobre nossa
consciência...
Tudo acaba e parece óbvio...
Acho que nada acaba...
Quando o grito ecoa até o infinito
Quis aproveitar cada segundo
Sem saber que não precisava ter pressa
Na fruição do término-sempiterno
Das coisas que nunca começam
Conquanto sempre se acabam
Muito embora os segundos fugissem
A vida é um louco tentando apanhar o
vento
Não sei mais que idade tenho
Perdi a vida contemplando o interminável
Não sei em que ponto do tempo parei para
escrever
Meus últimos versos
Porque são sempre os últimos
Tudo que existe só existe por último
Emerge na superfície das coisas
E, logo, se afunda no nada mais profundo
Tudo existe e se acaba, ao mesmo tempo
Existe neste estapafúrdio instante à
frente de tudo
Que logo dá lugar a outro ente que o
anula
A existência aniquila para tornar a
existir na nova forma emprestada
Como o corpo faminto que se autodestrói
no esforço que empreende tentando não se destruir...
Todo tempo é o último tempo
O tempo todo!
E tudo está acabado
O tempo todo!
Vago no tempo: uma célula errante no
Cosmo
Acuada, em algum canto do Universo
Algum preceito, alguma ideia distorcida
que me vigia pelas beiradas de minha existência que se dilui nas partículas do
Tempo, este tempo que nos criou, nos recria e que agora nos devora...
Se tudo termina, o que, de fato,
começou?
Se tudo começa, e recomeça, ora, o que,
pois, acabou?
Dorian Gray vendo-se desmanchar no
espelho...
Mas, para os antigos, sua alma retornou
e pode estar em qualquer lugar agora...