MINHA LEITURA
XVII
A Super Funai
Primeiro,
vamos matar todo mundo que se recusar a seguir nosso propósito: encontrar ouro,
plantar soja, vender carne para os chineses. Depois, daqui a centenas de anos,
vamos inserir quem tiver restado deste povo à nossa cultura, mas, vamos fazer
isso à força: se não for na base do chicote, vai ser na base da nossa lei. A
lei é para ser seguida, vai ter polícia para isso. A lei do convencimento não
existe, é porrada que convence. Terras para eles? Só para se distraírem mesmo,
a maioria das terras vamos tomar tudo. A gente quer plantar, mas não para
comer, mas para estocar e vender para quem tem dinheiro. Quem tá com fome que
trabalhe, se não achar trabalho que vá procurar comida no lixo. E, se precisar,
a gente vende até para fora, quem pagar melhor a gente vende, pode ser até para
o Estado Islâmico. Quando a gente mesmo tiver fome, a gente manda fazer ou
manda trazer, dinheiro não é problema, dinheiro
é mato, o que tá faltando é liguinha para amarrar.
Esse povo
tem que trabalhar para nós mesmo, fica ai se pintando, fazendo dancinha ao
redor da fogueira, para que isso? Cadê a roupa desse povo? Mas, não tem nada
não, como eu já falei, depois a gente põe esse povo num canto qualquer, numa
terra qualquer, desde que não atrapalhe a gente. Para um tal de Direitos
Humanos não ficar enchendo o nosso saco, a gente manda as escolas falarem desse
povo, só para constar mesmo, só para pagar nossa dívida genocida. Sabe como é,
né? “Valorizar a memória”. No presente, a gente toca o terror, depois a gente
cria essa onda de “valorizar a memória”. E que todo mundo entenda que isso
ficou no passado, estaremos perdoados!
E para que
serve a Funai? Ah, tá, vou te responder. Inventaram a Funai pelo mesmo motivo
que inventaram call centers: “não
deixa esse povo chegar perto de mim não, resolve com esses merdas ai!” Vou
explicar melhor. A Funai foi inventada para não termos que matar mais
indígenas, mas sim mantê-los em parques temáticos e peladões nos livros de
História.
Quer saber?
Tinha que acabar com isso. Isso mesmo, o indígena somos eu e você, somos todos
nativos da Terra. Se é para terem a cultura e a tradição deles preservadas,
então os deixemos lá na floresta, em paz, com suas próprias leis, sem nossa
interferência e eles sem interferir no nosso modo de viver. Estou sendo
agressivo de mais? Talvez até anti-humanista ou algo assim. Mas, opinião é para
ser dada, e nenhuma é definitiva. O que creio é que tinha que acabar com isso.
Por outro lado, se é para inseri-los, então vamos inseri-los. Mas, de verdade,
como qualquer outra raça ou etnia. Que estudem, que façam faculdade, que
trabalhem e este passará a ser o “indígena moderno”. O indígena bruto deixa
para o Ubirajara.
A Funai tem
a função de preservar o território indígena, assim como o de fomentar a
preservação de sua tradição e de sua cultura. História para boi dormir! A Funai é só mais um órgão corrupto
dentre tantos outros que dissimulam a verdade, que arrastam seus grandes corpos
pesados em direção a nada, esmagando nossas reais necessidades. Quem é que está
falando aqui? Ei, não sou dono da verdade! É minha opinião... A Funai é o filho
sínico do pai corrupto: o genocida SPI. Te machuquei? Bom, posso estar
errado... Só estou tentando ver as coisas desde os seus extremos... Demos
direitos aos indígenas para gozarmos o prazer de não cumprirmos nenhum deles:
somos uma sociedade, além de facínora, hipócrita!
A Funai
também tem o papel de promover, aos indígenas (sendo a Funai idealizada e
controlada por pessoas que não são indígenas!), a chamada “educação indígena”.
O que dá um grande nó em minha cabeça: “educação” e “indígena”! A educação tem
uma história totalmente indiferente à cultura indígena. Nem mesmo o termo
“indígena” tem origem “indígena”! Queremos ensinar o que, exatamente, aos
indígenas? Como exercerem profissões pueris, mal remuneradas, exaustivas,
subservientes? Ou será que são as contas de base 10? Ah, sim, talvez sejam histórias
de homens brancos que se auto declararam grandes heróis. Francamente!
Não sei,
com exatidão, o que seria o mais correto. Mas, tenho certeza de que muita coisa
não está certa! Ah, isto eu sei, isto todo mundo sabe...
Em qualquer
processo, enfim, haverá falhas, mesmo que quase invisíveis. Há órgãos como a
Funai, para a proteção dos índios, e o Ibama, para a proteção do meio ambiente;
porém, de modo geral, os agentes que atuam em nome dessas instituições acabam
por ultrapassar a margem da preservação cultural e não preservam nada, apenas
seguem protocolos criados por pessoas não indígenas para insinuar ao mundo que
algo está sendo feito para proteger os “bichinhos selvagens”.
Um exemplo
de falta de preparo é a alfabetização mal planejada de crianças indígenas (não
que isso signifique que toda intervenção e todo contato com a cultura indígena
seja mal planejada e ruim), fazendo-os esquecer sua própria língua, obliterando
a plenitude da cultura que, pela língua e produzindo língua, se recuperaria, se
fortificaria.
São muitos
os paradoxos, mas o que me dá náuseas mesmo são as contradições. Muitos valores
estão em jogo; há discursos que operam na criação de valores e que dirimem
muitos outros. Contudo, não são só discursos que distorcem a realidade; são,
principalmente, as condições que garantem a produção deste tipo de discurso:
condições criadas, modificadas, adulteradas, provocadas... E... enfim, mais uma
vez: muitas reticências...
bY DANILLO MACEDO